LAUDO PERICIAL E A OBRIGATORIEDADE DE SUA
FUNDAMENTAÇÃO
Perícia é a pesquisa,
investigação, averiguação, procedida por pessoa dispondo de conhecimentos
especializados, a propósito de coisa ou matéria necessária para a instrução do
processo. O perito age como auxiliar do juiz, suprindo a falta ou insuficiência
de conhecimento deste em matérias não jurídicas, tais como medicina,
engenharia, balística, etc. De todos os meios de informação pode utilizar-se o
perito para o desempenho de sua função.
O artigo 429 do Código de
Processo Civil explicita audiência de testemunha, solicitação de documentos que
estejam em poder de parte ou em repartições públicas, a obtenção de informações
em geral.
As conclusões do perito são
lançadas em uma peça denominada laudo. Distingue-se o laudo do mero parecer
porque o laudo é feito para prova de fato que depende de conhecimento especial
. Nele pode o perito proceder livremente, ouvir testemunhas, colher dados e
informações, juntar pesquisas científicas e etc. Já o parecer é uma mera
resposta à consulta de uma das partes sobre dados preexistentes. Infelizmente,
entretanto, os peritos nem sempre compreendem a razão de ser de sua presença
nos autos, que não é a de trazer simples opinião, e sim fatos, realizando
exames e providências indispensáveis.
A instrução do laudo com
plantas, desenhos, fotografias, gráfico e outras peças enriquece-o, completa-o,
dá-lhe força, preenche-lhe por vezes os brancos; revela o cuidado do técnico,
sua eficiência; valoriza sem dúvida o trabalho. Partindo-se de que o laudo
exprime as conclusões de seu autor, deve conter a indicação de todas as fontes
de informação; os trabalhos de pesquisa, os livros e documentos examinados, as
pessoas ouvidas, em síntese, a menção de tudo que, de interesse para a perícia,
ocorreu durante a diligência. SÉRGIO SAHIONE FADEL ensina que: "No laudo,
ou ao pé dele, devem os louvados (peritos) indicar as fontes de informação a
que acudiram, pois, não sendo idôneas, as partes ou o juiz podem impugnar o
laudo ou os elementos que lhe serviram de base".
Nada na lei impede o perito
de se manifestar através de aspectos também jurídicos dos fatos levados a seu
conhecimento especializado. É que toda a vida social é, na verdade, regida pelo
direito, nas suas linhas mais humildes como nas suas mais solenes
manifestações. É perfeitamente cabível e mesmo desejável que o perito indique
os dispositivos legais em que fundamenta suas conclusões. O laudo é obra de
pesquisa, de inteligência, de espírito, que exige do autor liberdade de ação
sem a qual dificilmente construirá um trabalho convincente. O laudo pericial
vale por sua força de persuadir, não pela autoridade de quem o subscreve.
É certo que a autoridade do
perito se conta na apreciação do laudo, mas o valor deste deriva dos
fundamentos lógicos que apresenta, das fontes de informação que lhe serviram de
base, da boa disposição da matéria e da linguagem com que vai transmitir as
suas conclusões técnicas ou científicas. Dispunha o art. 256 do Código de
Processo Civil de 1939: "Para a realização dos exames o perito procederá
livremente, podendo ouvir testemunhas e recorrer a outras fontes de informação.
O perito responderá aos quesitos em laudo fundamentado, no qual mencionará tudo
quanto ocorrer na diligência".
São regras de evidente
sabedoria, que vigoram mesmo não estando expressas atualmente na lei, as da
liberdade do perito e da fundamentação do laudo.
Com acerto advertiu Pedro
Batista Martins que o perito deverá trabalhar "sem estar adstrito a normas
de ação" e que "se o perito subtrair ao conhecimento do juiz e dos
interessados os motivos em que se baseou para emitir a sua opinião, nenhum
valor se poderá atribuir ao seu laudo"; que o direito de crítica da prova
em geral e, particularmente, da prova pericial "não poderia ser exercido
em toda a sua plenitude se o interessado ignorasse as razões em que se teriam
apoiado as afirmações do perito". E Jorge Americano observou que a
fundamentação do laudo é tão necessária quanto a da sentença. "O laudo
envolve ordinariamente um juízo, e o juízo vale pelo rigor da
argumentação".
O laudo pode conter omissão,
obscuridade, imprecisão em certas respostas, incertezas, até contradição. Para
completá-lo, suprir-lhe a falta, corrigi-lo num ou noutro ponto, há o remédio
dos esclarecimentos. Poderá o juiz, também, valer-se do parecer apresentado
pelos assistentes técnicos das partes. Esse é o ensinamento do professor GILDO
DOS SANTOS quando afirma que "Não será demasiado lembrar que só havendo
agora um perito, porque o das partes é mero assistente técnico, o juiz pode
rejeitar o laudo daquele e aceitar o de um dos assistentes". Poderão os
juízes, ainda, sempre que as suas convicções estejam em oposição com a opinião
dos peritos, rejeitar os laudos. Basta em todos os casos, que indiquem existir
na causa outros elementos próprios a determiná-los e que neles se fundamentem.
A jurisprudência pátria já consagrou:
"PROVA PERICIAL - LAUDO MAL FUNDAMENTADO
- NÃO ADSTRIÇÃO DO JUIZ. Não podendo o Juiz formar convicção em torno das
conclusões do laudo, por falta de fundamentação, aplica-se ao caso o art. 436
do CPC, coletando nessa peça e em outras dos autos todos os elementos
informativos que permitam chegar a uma solução satisfatória" (ADCOAS 14,
ano XI, p. 213).
"A perícia não vincula
o juiz, que tanto pode aceitá-la, integral ou parcialmente, como
rejeitá-la" (STF, RE 92.614-3/PR, 2ª Turma, rel. Min. Djacy Falcão, DJ de
12/09/80).
Há um princípio bastante
antigo de que o juiz não está vinculado ao laudo, isto é, não está obrigado a
aceitá-lo ou suas conclusões.
O artigo 436 do Código de
Processo Civil em vigor manteve essa regra que se compreende sem esforço.
Vejamos:
"Art. 436. O juiz não está adstrito ao
laudo pericial, podendo formar a sua convicção com outros elementos ou fatos
provados nos autos".
Se o juiz estivesse adstrito
ao laudo, o perito, por assim dizer, estaria, naquela matéria pericial, na
posição de juiz, e este subordinado, pois, àquele.
Importante ressaltar, no
entanto, que ainda que o juiz não esteja adstrito ao trabalho pericial, deve
declinar porque não acata o laudo. De outro lado, se esta é a posição do juiz
diante do laudo, fora de dúvida que esta peça deve ser sempre devida e
inteiramente fundamentada. Não se compreende um laudo, como válido, se não for
motivado, se não for claro, objetivo e que, em suma, não procure esclarecer
aquilo que determinou a realização da prova pericial.
Laudo sem motivação, sem
fundamentação, não se presta para embasar sentença judicial, ainda que se trate
de laudo de perito, isto é, do perito do juiz.
As respostas aos quesitos
formulados hão de ser completas e oferecerem as razões porque o perito chegou a
elas. Isto não obsta a que, numa parte geral ou introdutória do laudo, faça
toda a sorte de considerações que repute pertinentes e úteis, para, no momento
de responder aos quesitos, de modo conciso, reportar-se àquela parte que embasa
o seu trabalho e o seu laudo. Do contrário, a perícia de nada vale. A sentença
prolatada com base, unicamente, em laudo falho ou inútil não pode subsistir.
Texto confeccionado por:
Melina Lobo Dantas, Advogada, Professora de Direito na UNIT - Centro
Universitário do Triângulo, Especialista em Direito Processual Civil.